Por Marcos Alencar marcos@dejure.com.br 04/06/21
No Brasil, desde 1981 a primeira semana de junho foi instituída como a Semana Nacional do Meio Ambiente, que tem como objetivo promover a participação da comunidade na preservação do patrimônio natural do Brasil. (fonte google Brasil, acesso 4/6/21).
O que isso tem a ver com o direito do trabalho?
Essa semana tem tudo a ver com o ambiente trabalhista, porque ele se relaciona diretamente com a sociedade. Todos nós somos “trabalhadores” e as pessoas precisam trabalhar para sobreviver, portanto o trabalho está presente em todas as famílias, seja através de um emprego, do empreendorismo, de forma autônoma, etc. e a situação do meio ambiente do trabalho, toca principalmente no ponto da regulação dessa relação da mão de obra com o capital.
A pergunta básica é: A relação capital trabalho está atendendo a regulação ou é uma burla? – Muitos pontos equivocados, a meu ver, são debatidos, quando pontos pragmáticos e objetivos deveriam ser considerados e literalmente fiscalizados. Temos muita “seda” para rasgar, porque as irregularidades trabalhistas saltam aos olhos. Os que são especialistas não veem porque não querem.
Vejo como uma tremenda hipocrisia se defender (embandeirando) a semana nacional do meio ambiente, e, ao mesmo tempo, se contratar pessoas como falsas pessoas jurídicas; sonegar horas extras; não cumprir a cota de deficientes; ter comissão interna de prevenção de acidentes falsa, somente para “inglês ver”; ter na própria Casa uma empregada doméstica sem registro; ou seja, tudo isso apenas para dar um contexto básico de que muito se fala e pouco (efetivamente) se faz.
Um outro ponto contundente de abandono social e a mercê do acaso, é a omissão do Congresso Nacional em não se mexer para regulamentar a profissão dos trabalhadores de aplicativos, como se eles pertencessem a uma segunda classe. Estes trabalhadores são literalmente marginalizados, porque trabalham “a margem” de todo o arcabouço legal, sem nenhuma proteção jurídica. A sociedade segue silente na sua grande maioria, contribuindo para que essa cadeia produtiva rode e omite-se também ao não exigir que as gigantes do setor se auto regulem e/ou provoquem o Congresso.
Isso é sim possível e fácil de ser feito. Temos como exemplo concreto o Magazine Luiza que enfrentou a questão racial dos postos de gestão, se auto regulando e criando uma política própria de inclusão social, procedimento este que surpreendeu a todo o mercado e que foi apoiado pelas autoridades do trabalho.
Portanto, a sigla “ESG” que significa – Environmental, Social and Governance (em português, Ambiental, Social e de Governança), tem sim esse ponto “social” em franco contato com o direito do trabalho, em sentido amplo.
Quais as mais sinistras práticas trabalhistas, que a fiscalização do trabalho ainda é tímida em combater?
Bem, pela minha visão de rotina trabalhista, enxergando o que os robôs não enxergam (Explico: porque eles só veem o que está ajuizado) nosso País tem ainda em índices absurdos, o seguinte:
- Pejotização (contratação de empregados como falsas pessoas jurídicas);
- Excesso de jornada (trabalho em regime de horas extras, sem registro);
- Excesso de trabalho (demandas) no home office;
- Contratação de empregados sem nenhum registro;
- Pagamento de parte do salário (comissões, etc.) por fora;
- Trabalho infantil (principalmente nas regiões interioranas);
- Acumulo de função sem pagamento de salário;
- Trabalho sem condições mínimas de segurança (violação das Nrs);
- Exposição de trabalhadores ao risco sem a devida compensação (regulação) nas profissões de alto risco (que continuam sem definição, o que gera insegurança jurídica);
- Contratação de empresas terceirizadas que não cumprem com os básicos direitos trabalhistas e contratam pessoas sem registro (freelas, etc.);
- A discriminação tanto da mulher quanto do negro, nas contratações dos postos de alta gestão (tema enfrentado pelo Magazine Luiza);
- Etc.
As violações sociais repercutem no crescimento do “dumping social”?
Sim. O “dumping” existe porque quem contrata sonegando direitos trabalhistas (relação de emprego, horas extras, INSS, etc.) tem condições de precificar melhor o seu produto e com isso concorrer em deslealdade com as empresas que cumprem com os ditames da lei. Além da sonegação de direitos sociais e de tributos, quebra-se o mercado. Os que cumprem e a lei, pela falta de fiscalização, passam a se perguntar se realmente vale a pena agir corretamente e cumprir com todas as regras trabalhistas.
Quais as boas práticas trabalhistas que o mercado consumidor e corporativo pode instituir?
Quando falamos de “boas práticas”, é preciso que se faça a leitura, daquilo que quando é visto, passa a ser elogiado por quem vê. Isso me faz recordar os ensinamentos do meu Pai, quando eu comecei a trabalhar. Ele dizia que, se o que eu estava escrevendo não me traria vergonha ao ler em voz alta em qualquer local, inclusive na presença dele, é porque eu estava no caminho certo. Se o que o empresário está fazendo/realizando na Empresa não trará vergonha aos seus filhos e demais familiares, leia-se como “boas práticas”. A boa prática é fazer o certo e como ele deve ser exercido.
Para termos isso disciplinado e formalizado, a governança é o melhor caminho, isso quer dizer, que uma Empresa ao agir assim não teme qualquer indagação de como ela se relaciona com a mão de obra que lhe atende. Quem anda certo, não se preocupa em expor amplamente todas as relações, porque as mesmas são sadias e a transparência e a publicidade deixarão mais valorizado o negócio e que àquela Empresa não é hipócrita, que ela realmente cumpre o seu papel social sem burlas; sem o tão famoso “jeitinho brasileiro”.
Podemos considerar hipócritas, algumas grandes corporações que se dizem engajadas no meio ambiente e ao mesmo tempo não respeitam as mais básicas regras trabalhistas?
Sim. Temos gigantes e de vários setores da economia levantando a bandeira do ESG e ao mesmo tempo adotando práticas trabalhistas totalmente avessas as previstas em lei. O maior exemplo é a pejotização, que se caracteriza pela contratação de empregados como se empresas fossem, apesar de eles trabalharem de forma continuada, exclusiva, subordinada, onerosa, pessoal, nos moldes definidos pelos art. 2º e 3º da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, que definem a figura do empregador e do empregado.
A pandemia aumentou a proteção ambiental dos trabalhadores ou ao contrário, traz um retrocesso?
Piorou e muito. Várias empresas dos setores mais atingidos com a pandemia, demitiram seus empregados e estão trabalhando com clandestinos; com falsos PJs; com terceirizados que empregam clandestinos; etc. O Governo Federal rema na contramão dos fatos, infelizmente, porque apesar de termos hoje quase 14 milhões de desempregados; 50% dos lares com trabalhadores domésticos sem registro; uma infinidade de jovens sem chance no primeiro emprego; etc., não temos sequer um Ministro do Trabalho para administrar essa crise que se arrasta por décadas. O enfraquecimento da fiscalização do trabalho, segue o mesmo rumo, porque resta claro que a SPT – Secretaria Especial de Previdência e Trabalho não tem a estrutura para suportar todas estas demandas. O tema trabalhismo no Brasil, está esquecido, é essa a minha avaliação desde o início do Governo atual. A edição das Medidas Provisórias no decorrer da Pandemia, não conta, porque isso foi obtido a fórceps, ou fazia ou teríamos saques, pelo natural agravamento da fome nas famílias.
Qual a solução para este ano “ambiental” que se inicia?
A solução tem que partir do Governo Federal. O que coloca a “coisa” nos trilhos, é a máxima do “crime não compensa”. Da mesma forma que a Receita Federal fiscaliza os sonegadores, dever-se-ia fazer com os que andam fora da legislação trabalhista. Não estou aqui pregando uma caça desenfreada às empresas, porque sempre defendi que a maior missão do então Ministério do Trabalho, era a de educar e de apoiar o empreendedorismo, porque são as empresas que pagam a conta através dos impostos, da previdência, etc. O que defendo é um plano nacional de ação, baseado em dados técnicos. Precisamos de um GT (grupo de trabalho) nacional, que compreenda as cinco regiões do País e que atue dando um direcionamento, com apoio das entidades de classe e patronal; com as Universidades Federais; em conjunto com inúmeras empresas que prestam consultorias para grandes grupos nacionais e internacionais que aqui atuam e que certamente se predispõem a ajudar, etc. que ajude e ao mesmo tempo que fiscalize os abusos, dando chance para correção. Precisamos de um pacto federativo de busca e de ampliação do emprego, da ocupação (sentido amplo) e da renda. Na medida em que a população de quase 14 milhões de pessoas sem esperança passam a ter um alento, uma chance de obter renda (de forma regulada), teremos o retorno imediato na economia. A prova disso está no pagamento dos benefícios emergenciais e nos saques do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) que fizeram com que a economia não parasse por completo (agora na pandemia). Não vejo, no momento, nenhuma ação estratégica do Governo Federal e nem dos Governos Estaduais, de forma macro, para combatermos esse gravíssimo problema, percebo que a omissão é tremenda, infelizmente.